quarta-feira, março 29, 2006

emoções?!

Olhou para a empregada nos olhos e viu através deles aborrecimento, estava só na mesa acompanhado do jornal e pensava enquanto falava, penlava enquanto fansava numa maneira, num paradoxo... de se sentir incompetente na tarefa de aliviar-lhe os lábios da sua forma tão convexamente descendente.
Pediu um galão e um croissant misto prensado que ficava ao mesmo preço de uma desensaboada sandes mista - um euro e dez - com o galão - um euro e noventa. Leu o jornal na diagonal e pagou com dinheiro certo.
Enquanto caminhava sozinho entrando no bairro lembrou-se de que se havia esquecido das chaves dentro de casa e rapidamente meteu as mãos aos bolsos na procura do telémovel... ainda era de manhã teria um dia inteiro pela frente até que alguém chegasse a casa, um maço de tabaco no bolso era tudo o que precisava e os trocos resolveriam-lhe os incómodos de andar na rua à chuva, que pior do que molhar castiga os transeuntes sem chusso e de calças brancas prontinhas a serem alvejadas pela pontaria certeira dos pneus automobilísticos nas poças... assim, incomunicável e sózinho resolveu tirar uma folga da vida... enfim o que faria se estivesse a esta hora em casa sozinho... exatamente o mesmo: tiraria uma folga da vida... morreria porque para morrer a solidão é a única companheira... seria por isto que ouvia tanta gente afirmar que a solidão em casa os assustava e os deixava em estado de animaleza? certamente já havia sentido por diversas vezes essa ânsia mas seria mesmo tal facto um convite para a morte?... o assunto começava a irritá-lo e procurou no andar de um corpo redondamente harmonioso a paz de espírito... seguiu o seu caminho alheado do mundo, no fundo continuava só e só preferiu continuar porque uma folga da vida não se faz acompanhado, simplesmente no meio daquele centro comercial via caras conhecidas e a algumas travava mesmo upgrades interaccionais pensando sempre que no fundo até fora melhor ter esquecido o peso das chaves para trás... quando o corpo em algumas horas se moldara já à cadeira em que estava sentado naquele canto, teve de se mexer e regressado do lado de lá levantou-se e como lázaro andou como se nunca tivesse andado antes. Foi para a porta do prédio de sua casa... só, como tantas vezes acontecera em criança, entregou-se ao chão frio da entrada como fora sofá e qualquer vestígio humano que não o de seu colega de casa o irritava profundamente mas sempre vivo, sempre alegre e pensativo...

domingo, março 26, 2006

Lei Seca

Enquanto tentava mais uma vez regular a água do chuveiro lembrou-se e pensou automaticamente que na altura havia discordado... não dissera nada. Sentiu a boca áspera e um rombo no estômago, por pouco não subira para o balcão acto demonstratório da valente ressaca. Ao tocar-lhe a água nos dedos dos pés bolhentos vinha já morna e na verdade não dissera nada porque não havia pensado muito bem no assunto ou porque chegara á conclusão de que na verdade nas aldeias e em especial as do interior a pressão da água nunca vem com a mesma força do que no litoral, bem pelo menos se tivesse em casa a tomar um banho ela estaria com pressão e ao meu gosto, mas assim... cá estava ele a tremer de frio enquanto sabia esperá-lo uns valentes escaldões. Riu-se da situação... cá estava ele havia uma hora, a água não tinha pressão suficiente para aguentar a água fria e a boca continuava a precisar de uma escovadela rapidamente. Quando fora crente poderia talvez revoltar-se contra Deus se fosse um mau crente... no fundo quem se revolta contra Deus não é um mau crente simplesmente iniciou o caminho que o levará à descrença pura e total, não ele na infância ter-se-ia resignado na contínua luta contra o diabo revoltar-se só o poderia fazer contra Deus... era mais uma provação divina ou uma maneira do diabo se divertir... mentes retorcidas sentidos de humor estranhos não? Mas e agora? contra quem lançar a sua ira? contra o smas, o facto de estar ali naquele preciso local, será que se pagasse residência a todos os habitantes do litoral no interior iria aliviar-lhe a dor por a poder partilhar depois á mesa do café? Lembrou-se daquele episódio de Seinfeld no qual Kramer soluciona o problema de Jerry de falta de pressão indo ao contrabando arranjar o ferrari dos duches... sorriu e disse para consigo mesmo que era mesmo disso que precisava... mesmo sabendo que um duche novo não era a solução para o seu problema... afastava assim o problema da revolta ao adaptar-se ao sistema e tudo ficaria em paz... podendo quem sabe mesmo vir a gozar com os amigos no café ou apresentar aquilo como um Pró a um futuro inquilino daquele quarto dos fundos. Por esta altura havia já decidido aguentar com os escaldões na pele enfim não arranjara um duche novo no contrabando mas adaptara-se e rendera-se às evidências aquela não era a hora dele e por muito que puxasse por ele nada iria obter a não ser uns breves escaldões. Agora já com água fria escovava finalmente os dentes e pensava na notícia do dia anterior: 3 toneladas de cocaína a boiar ao largo de Sesimbra... desde o início do ano os plátanos haviam já apreendido 16 toneladas de droga, mais em 3 meses do que o ano passado todo. É a lei seca... não havia droga e se bem se lembrava esta era maior seca por que passava.. quando comprava era de má qualidade, os restos e quando queria comprar mesmo estando disposto a pagar preços exorbitantes não havia... notava-se na cara de toda as pessoas pertencentes à tribo a cada notícia nova sobre apreensões no jornal das oito... era a lei seca e ele acabava de acender um cigarro pois a ressaca puxava...